Redirecionamento ilegítimo da execução fiscal: as hipóteses de responsabilização dos sócios por dívidas tributárias das empresas.
Ultimamente, diante da voracidade do Fisco em aumentar a sua arrecadação, os diretores, sócios e até mesmo gerentes têm sido incluídos no polo passivo de execuções fiscais propostas contra a pessoa jurídica na qual exercem os referidos cargos, inclusive aqueles que já haviam deixado a sociedade à época do ajuizamento da demanda executiva.
Na maioria dos casos, tais pessoas são incluídas na ação por força do redirecionamento da execução fiscal, em virtude de requerimento das Fazendas Públicas quando não são localizados bens em nome da empresa passíveis de penhora ou nos casos em que a empresa deixa de exercer suas atividades no domicílio fiscal sem a devida comunicação aos órgãos competentes.
O Fisco, todavia, é pouco ou nada cuidadoso quando formula o pedido de inclusão das pessoas físicas no polo passivo da demanda. Comumente, não é realizada a devida análise das alterações no quadro societário e da data de ocorrência do fato gerador dos créditos tributários, incluindo-se, por vezes, pessoas que há muito não integravam a sociedade, e que se retiraram da empresa antes mesmo da ocorrência dos fatos originadores do tributo ou da constatação de dissolução irregular da pessoa jurídica executada.
Por desconhecer as hipóteses de responsabilização, tais pessoas físicas acabam sucumbindo ao pagamento ou parcelamento do débito de responsabilidade exclusiva da pessoa jurídica, com vistas a evitar possíveis constrições em seu patrimônio. Por essa razão, é de grande importância saber quando e como essas pessoas físicas poderão responder pessoalmente por dívidas tributárias da pessoa jurídica.
O sócio apenas responde por débitos tributários da empresa em relação aos atos em que intervier ou pelas omissões de que for responsável, no caso de liquidação de sociedade de pessoas (art. 134, inciso VII, CTN) ou por créditos correspondentes a obrigações tributárias resultantes de atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos (art. 135, CTN).
A responsabilidade do sócio ou ex-sócio, portanto, não decorre automaticamente da ausência de pagamento do tributo devido pela pessoa jurídica. Para que seja legítimo o redirecionamento da execução fiscal contra o sócio, o Fisco deve demonstrar que a dívida tributária exigida decorreu de atos praticados “com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos” à época de sua presença no quadro social, tendo em vista que a sua responsabilidade se conecta com os atos que tenha praticado ou com as omissões pelas quais for responsável.
Sobre o tema, o Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp 533895/RS, assim decidiu: “O redirecionamento da execução fiscal para os sócios-gerentes da empresa somente é cabível quando comprovado que ele agiu com excesso de poderes, infração à lei ou contra o estatuto, ou na hipótese de dissolução irregular da empresa”. (STJ, T2, Rel. Min. Peçanha Martins, REsp 533895/RS, DJ: 25.05.2006, p. 208).
Em relação ao outro motivo para a inclusão das pessoas físicas como rés de processos de execução, recentemente o STJ considerou que, ainda que reste configurada a dissolução irregular da sociedade, é imprescindível que a pessoa física contra quem se pretende redirecionar a execução fiscal preencha os requisitos do art. 135, do CTN e, cumulativamente, tenha estado presente nos quadros da sociedade tanto ao tempo da ocorrência do fato gerador do crédito tributário inadimplido, quanto ao tempo do encerramento irregular das atividades da sociedade. (AgRg no REsp 1120407/SP, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 18/04/2017, DJe 04/05/2017).
A liquidação irregular da sociedade de pessoas que enseja a responsabilização do sócio (art. 134, inciso VII, do CTN) é somente aquela “caracterizada pela extinção da empresa com desvio, em proveito dos sócios, do patrimônio social” (STJ, T2, Rel. Min. Humberto Martins, AgRg no REsp 961846/RS, DJ: 16.10.2007, p. 366).
Suponhamos que determinado sócio se retire da sociedade, com o devido registro na Junta Comercial, e após o referido ato, a sociedade contraia uma dívida tributária, tendo contra si ajuizada demanda executiva para a cobrança de tais créditos.
Neste caso, não seria cabível o redirecionamento da execução fiscal em face do ex-sócio, uma vez que o fato gerador do crédito tributário ocorreu após a sua legítima saída da empresa.
Nesta mesma situação, se a sociedade tivesse continuado a exercer suas atividades por um longo período após a saída do antigo sócio, e somente então encerrasse irregularmente suas atividades, a liquidação inadequada da mesma forma não poderia atrair a responsabilização pessoal do ex-sócio, uma vez que se retirou da sociedade em momento anterior ao da dissolução.
A despeito dos precedentes do STJ, o Fisco continua insistindo em incluir no polo passivo das execuções fiscais as pessoas físicas que não são responsáveis pelas dívidas tributárias, haja vista que, concomitantemente, não compunham o quadro social da empresa à época do fato gerador do crédito tributário e no momento da constatação da dissolução irregular.
Assim, revela-se extremamente necessário atentar para as eventuais ilegalidades e arbitrariedades cometidas pelo Fisco quando pleiteia o redirecionamento da execução fiscal contra pessoas físicas, adotando de imediato as providências de defesa no processo judicial, de modo a afastar a responsabilidade pessoal dos sócios e ex-sócios, gerentes e diretores pessoas físicas pelos débitos da sociedade empresária da qual faz ou fazia parte.
Por Alberto Carvalho