A ilegalidade da tarifa de conveniência nas vendas de ingressos online
Na última terça feira (12) o Superior Tribunal de Justiça julgou recurso proveniente de Ação Coletiva ajuizada pela Associação de Defesa dos Consumidores do Rio de Grande do Sul (ADECONRS) em face da empresa Ingresso Rápido.
A ação discutia a validade da cobrança da tarifa de conveniência na venda online de ingressos para espetáculos culturais, tendo a Corte Superior entendido que se trata de venda casada, prática ilegal e abusiva.
Segundo o STJ, a venda do ingresso é parte essencial do negócio, risco da própria atividade empresarial que visa o lucro e integra o investimento daquele que promove o evento. Tais custos, portanto, não podem ser transferidos ao consumidor.
Uma das circunstâncias cruciais para que o tribunal chegasse a este entendimento foi o fato de que os ingressos comercializados em meio virtual, em muitas situações, representam a absoluta maioria das vendas, de modo que o consumidor se vê compelido a contratar com aquele intermediário. A liberdade dos consumidores na escolha do intermediador fica cerceada, o que configura a venda casada nos termos do artigo 39, I e IX do Código de Defesa do Consumidor[1].
O grande questionamento que fica a partir desta notícia é como os promotores de eventos irão se portar a partir de agora. A decisão é válida em todo território nacional e pode ser exigida por qualquer consumidor?
A princípio, as ações coletivas promovidas por associações, como foi este caso, beneficiam apenas aqueles que comprovadamente estavam vinculados à entidade no momento do ajuizamento, como já decidiu o Supremo Tribunal Federal[2]. No entanto, o artigo 103, III, do CDC dispõe que as sentenças proferidas em ações coletivas que acolhem o pedido produzem efeitos para todas as vítimas.
A situação envolvendo a cobrança da tarifa de conveniência atinge de maneira uniforme todos os consumidores em território nacional, razão pela qual os efeitos desta decisão não se restringem ao local onde a ação foi proposta. Vale destacar que este posicionamento foi pacificado pelo STJ desde 2011 (vide Recurso Especial Repetitivo nº 1243887[3]).
É evidente, por outro lado, que a cobrança da tarifa de conveniência em determinada compra dificilmente provocará um consumidor a mover, individualmente, ação judicial para afastá-la, já que via de regra os valores não são expressivos. Cumpre observar que no mesmo julgamento o STJ entendeu que a situação não provocou dano moral coletivo, pois se limitaria a uma mera infringência à lei incapaz de atingir valores essenciais da sociedade. Sob o mesmo raciocínio, o dano moral individual não se apresenta nesta situação, e a eventual demanda judicial teria por objeto apenas o valor da tarifa.
Por esta razão, acredita-se que a decisão do STJ deverá servir como evento provocador para que outras entidades coletivas de defesa do consumidor, assim como os órgãos oficiais (PROCON, CODECON) e Ministério Público atuem para coibir esta prática em eventos culturais e esportivos. A medida mais adequada para um consumidor que se sinta lesado com a cobrança é buscar estes agentes de fiscalização, que deverão agir em benefício da coletividade.
Não se descarta, porém, que os promotores dos eventos sigam praticando a cobrança nos casos em que de fato é disponibilizado ao consumidor diversas possiblidades de venda (inclusive em meio virtual), já que nesta hipótese não haveria a imposição de intermediário citada no referido julgamento.
Será preciso, portanto, observar
como se dará a consolidação desta jurisprudência, o que dependerá
essencialmente da atuação dos diversos órgãos de fiscalização consumeristas.
[1] Art. 39. É vedado ao fornecedor de produtos ou serviços, dentre outras práticas abusivas:
I – condicionar o fornecimento de produto ou de serviço ao fornecimento de outro produto ou serviço, bem como, sem justa causa, a limites quantitativos;
IX – recusar a venda de bens ou a prestação de serviços, diretamente a quem se disponha a adquiri-los mediante pronto pagamento, ressalvados os casos de intermediação regulados em leis especiais;
[2] Tese fixada no RE 612043: A eficácia subjetiva da coisa julgada formada a partir de ação coletiva, de rito ordinário, ajuizada por associação civil na defesa de interesses dos associados, somente alcança os filiados, residentes no âmbito da jurisdição do órgão julgador, que o fossem em momento anterior ou até a data da propositura da demanda, constantes de relação juntada à inicial do processo de conhecimento.
[3] Tese fixada no REsp 1243887 / PR: Os efeitos e a eficácia da sentença não estão circunscritos a lindes geográficos, mas aos limites objetivos e subjetivos do que foi decidido, levando-se em conta, para tanto, sempre a extensão do dano e a qualidade dos interesses metaindividuais postos em juízo.