Com crise, mais incorporadoras podem pedir recuperação judicial
O pedido de recuperação judicial da construtora Viver, apresentado há pouco mais de uma semana, pode ter aberto caminho para outras empresas de incorporação imobiliária recorrerem ao mesmo expediente com vistas a garantir sua continuidade operacional. A crise econômica do país e seu forte impacto nas vendas de imóveis, o aumento dos distratos e o encarecimento do crédito comprometem a estrutura de capital de empresas, que já vinham lutando para se manter em dia com os compromissos financeiros, na avaliação de profissionais do setor e da área jurídica.
Além de incitar especulações sobre potenciais candidatas à recuperação judicial, a iniciativa da Viver, apurou o Valor, instaurou um clima de apreensão nos bancos que estão expostos a esse setor. Ao fim do segundo trimestre, o passivo total das incorporadoras listadas em bolsa superava R$ 45 bilhões, uma parte referente a recursos tomados junto aos bancos como dívida corporativa e para a produção de imóveis. “É possível que novos pedidos sejam feitos nos próximos meses”, diz o advogado Eduardo Takemi Kataoka, do escritório Galdino, Coelho, Mendes Advogados, que está à frente do processo da Viver.
A mesma leitura é compartilhada pela consultoria Alvarez & Marsal, que é especializada na recuperação de empresas e desde fevereiro trabalha na reestruturação da Viver. “Essa deve ser a primeira de algumas empresas, mas não temos claramente a visão de quais seriam as outras”, afirma o diretor-geral da A&M na América Latina, Luis de Lucio. Uma combinação de fatores macroeconômicos e o fato de o mercado imobiliário não reagir tão rapidamente em momentos de recuperação contribuem para o cenário desafiador, conforme De Lucio.
A crise na indústria, comenta o executivo, remete a 2012 e a situação continuou se deteriorando até 2016. Nesse intervalo, a taxa de desemprego passou de 4,6% (em dezembro daquele ano) para 11,3% em junho, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), e a taxa de juros saiu de 7,25% para 14,25% ao ano.
Ao mesmo tempo, o número de imóveis vendidos praticamente caiu à metade e os distratos (devoluções por compradores de imóveis às incorporadoras) atingiram a marca de 45% em junho deste ano, segundo dado da Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias (Abrainc) em outras palavras, para cada dois imóveis vendidos, praticamente um retorna às empresas e vão novamente à venda. Os estoques, por sua vez, seguem em volumes constantes desde 2012, mas, com a queda na procura a velocidade de vendas caiu para cerca de 30% (para zerar os estoques, seriam necessários quase três anos).
A percepção é que há três grupos mais sensíveis a esse cenário. O primeiro é formado por companhias listadas em bolsa que têm enfrentado dificuldades financeiras e são recorrentes no setor citações a PDG Realty e Rossi Residencial. A PDG anunciou no início de agosto a reestruturação de R$ 4 bilhões em dívidas com seus principais credores, passo considerado fundamental para retomada de obras paradas e entrega de projetos em curso. Para um analista, que preferiu não se identificar, isso protege a companhia ao menos no curto prazo. Procurada, a PDG informou que não comentaria o assunto.
A Rossi, por sua vez, iniciou em agosto do ano passado uma profunda reestruturação operacional e financeira, o que resultou em redução de cerca de 45% de suas operações. No fim de março, informou a conclusão parcial do processo de reestruturação de 90% de dívida corporativa com os principais credores, Bradesco e Banco do Brasil, com extensão do prazo de pagamento e redução dos custos financeiros. “Os principais credores estão suportando integralmente a nossa operação”, diz o diretor financeiro e de relações com investidores da Rossi, Fernando Miziara. “Falar em recuperação judicial da Rossi é leviano. Não existe e nunca existiu”.
O segundo grupo de empresas potencialmente mais afetadas pela crise compreende incorporadoras vinculadas a construtoras envolvidas na Operação Lava-Jato. E o terceiro grupo é formado pelas incorporadoras regionais, de médio e pequeno porte, que podem estar enfrentando dificuldades para acessar recursos junto aos bancos seja para rolar dívidas, seja para financiar a operação e também têm sido afetadas pela suspensão de obras.
De acordo com a M&A, há outro fator que tem tirado o sono de gestores de incorporadoras: o elevado volume de ações movidas por clientes após atrasos em obras, entrega com qualidade duvidosa e não entregas. A estimativa é de que as empresas no setor estejam enfrentando, neste momento, “milhares” de ações dessa natureza.
Fonte: Sinopse Diária de Noticias | Valor Econômico